O outono da minha alma.
Deixe as folhas caírem! Essa é a frase que coroa a estação, quando o verde cede ao amarelo, e o amarelo se torna laranja. É o momento em que a vida se torna escassa, e, aos poucos, as cores mudam – do vívido ao seco. Essa dança mortal de transição é vista pelos olhos humanos como beleza. Uma jogada cínica e divina? Um chá servido no divã das cores, onde transitamos para a feliz infelicidade daqueles que observam, e, assim, vivemos o outono que toma forma no espaço interior da minha alma.
Sempre fugi dessa estação – a estação da transição. Dentro de mim, as folhas que pareciam mais cheias de vida despencam das árvores; os jardins mais belos murcham e morrem. Ah, se eu pudesse pular direto para o inverno que logo chegará à minha alma – com sua chuva fina, gelo seco e geada. Eu chorava e admirava a dor fria e nebulosa que habitava o meu espírito. Mas não posso evitar essa estação. Se o fizer, ela retornará cada vez mais cruel. Pelo menos, foi o que me disseram – ou talvez tenha sido o que murmurei a mim mesma, silenciosamente, na minha dor muda, que norteia meus pensamentos e organiza cada um deles em pequenas caixas.
Organizo-os, pois assim posso enxergar mais claramente: como andam os pensamentos na minha mente, os sentimentos no meu peito e por que as dores no meu corpo insistem em permanecer. Já decidi que não vamos pular essa sequência – não há como fugir de uma dor tão profunda. Seria inútil. Isso só pode ser dor de alma. Será que ela é frequente nesta estação?
Lá fora, o outono é belo – amarelo, mas frio. Eu persigo o sol que ainda se estende sobre mim, como a penumbra do fim do dia: sem força suficiente para me aquecer, mas bonito o bastante para me iludir, fazendo-me querer sair, mesmo que o vento sopre gelado e rápido. Engano-me com minha falsa percepção do tempo. Deveria eu procurar calor?
Não é feliz, mas é belo ser mais uma vez a rainha dos forros de prata, e dedicar o meu tempo a tal estação sentada na varanda, por vezes na janela da minha sala. Então, deixe as folhas caírem. Uma a uma, vejo-as se renderem ao vento que atravessa as árvores, mudando planos, alinhando sonhos, chorando pelos que se foram e abraçando esse pequeno vendaval alaranjado, seco e belo que cresce dentro de mim.
Hei de me aquecer com um chá e um bom cobertor sentada em um banco de frente para a janela do meu quarto, aquietando impulsos ilusórios de ansiedade, deixando todo o cisco sujar o meu chão sem tentar limpar até o fim dessa estação. E deixar-me levar sobre as asas do vento que vem soprando-me para um território novo pois agora o esforço é em vão. Vou então me esforçar apenas, para permanecer em silêncio, ouvir o som das folhas que se derramam e chorar sobre elas, cortar os troncos das árvores mortas e preparar a minha lareira, pois em breve minha alma há de hibernar – com soluços de uma tristeza sem solução, onde eu preciso de tudo menos de atenção.
A melodia doce e aguda que ouço tocar – acordes menores no piano e no violão – aprofunda minha percepção de que, por mais acelerada que esteja minha mente agora, e por mais irritante que seja a espera, existe esse inevitável outono em que sofro no corpo as dores da alma, observando da janela o devaneio da morte e escrevendo sobre a beleza dura dessa transição.